Abusos da mídia escancarados na TV


Pois é. Não é sempre que vemos um órgão de imprensa, ainda mais uma emissora de TV, discutir os abusos da própria imprensa. A TV Paraná Educativa exibiu no domingo, dia 5, no programa Brasil Nação, apresentado pelo jornalista Beto Almeida, um rico debate sobre as peripécias da nossa grande mídia. Teve a participação dos jornalistas Luis Carlos Azenha (da Rede Record e do blog Vi o Mundo), Leandro Fortes (da revista Carta Capital) e Alípio Freire (do jornal Brasil de Fato).

Temas quentes apareceram na tela, tanto pelas perguntas do apresentador como de telespectadores. Como a Operação Satiagraha, da Polícia Federal, que resultou na prisão e condenação do banqueiro Daniel Dantas, com destaque para a perseguição ao delegado Protógenes Queiroz e as repetidas declarações do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes.

PUBLICAÇÃO DE PAUTAS E NÃO DE NOTÍCIAS - Ao falar do processo de criminalização contra Protógenes, articulado pela grande imprensa, Fortes apontou um fenômeno que chamou “publicação de pautas e não de notícias”. Ou seja, não há compromisso com os fatos, mas com campanhas definidas a partir de interesses específicos pelos donos e/ou seus agentes dentro das redações, sempre com um determinado viés político e ideológico. Não por acaso se diz que a grande mídia é o verdadeiro partido de direita no Brasil.

Azenha, que já foi repórter da Globo, reforçou tal visão ao confirmar a articulação entre grandes veículos, como a revista Veja e a TV Globo, para orquestrar tais campanhas. Falou do “jogo político articulado, com uma lógica própria”, lembrando que às vezes o assunto de capa da próxima semana da Veja já saía no Jornal Nacional do sábado.

O assunto veiculado, dentro de uma mesma orientação editorial, ganha então as páginas e as telas dos demais veículos durante a semana, formando uma corrente de pensamento único por todo o país, induzindo mentes e corações, com foros de verdade absoluta, numa torrente de opiniões indiscutíveis (óbvio que com as devidas limitações, pois pelo menos no caso dos chamados jornalões, os debatedores acreditam que “cada vez mais eles falam para si próprios”. Também foi lembrada a influência crescente de blogs e sites na Internet).

Esse fenômeno da “publicação de pautas”, explicou o repórter da Carta Capital, foi muito claro quando do chamado Mensalão, na efervescência das CPIs, e seu aparecimento mais recente deu-se justamente na fritura do delegado Protógenes. Fortes lembrou que a suposta gravação de uma conversa, sem qualquer importância especial, entre Gilmar Mendes e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), motivo de tantos estragos, até hoje não foi comprovada – e não será, acredita ele. No entanto, continua como fato indiscutível entre os articulistas da grande imprensa.

CONTROLE DAS VERBAS DE PUBLICIDADE - Debateu-se também sobre a necessidade de controle, pela sociedade, das verbas públicas empregadas nos anúncios na grande imprensa, assunto levantado por Alípio Freire (só do governo federal chegaria à soma de 1,5 bilhão de reais anualmente, sem incluir, claro, os gastos dos governos estaduais e municipais. Beto Almeida comentou que o governo do Paraná tem custo zero com a grande mídia).

O representante do Brasil de Fato foi enfático ao denunciar os abusos. Disse que antes se dizia que a imprensa dependia das grandes empresas, dos anúncios, era financiada pelas corporações para defender seus interesses. “Agora não, agora a grande mídia é sócia do grande capital”, frisou, explicando que as empresas de comunicação fazem parte de grandes grupos empresariais, entrelaçadas em diversas atividades econômicas e financeiras. Ou seja, como vão defender o interesse público, mito que elas alimentam dia-a-dia?

Dentre vários outros temas abordados em uma hora e meia de programa, Leandro Fortes abordou ainda a grave denúncia contra o diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, acusado em matéria de sua autoria na Carta Capital, com todas as provas cabíveis numa matéria jornalística, de torturar uma doméstica (ela sofria de diabetes e acabou cega) quando delegado da PF no Rio Grande do Sul. Não houve até agora qualquer repercussão na grande mídia, nem qualquer providência do governo federal.

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