BLOGUEIRA CUBANA: “OBAMA É PRÓXIMO DE MINHA GERAÇÃO”



Entrevista com Yoani Sánchez, por Salim Lamrani, jornalista francês: “Os prêmios internacionais, o blog e Barack Obama” – Parte 5   
(A entrevista é bem longa: esta é a quinta das oito partes em que está dividida. Peguei no blog Fazendo Media: a média que a mídia faz. O título acima é deste blog)
Salim Lamrani – Voltemos a seu caso pessoal. Como explica esta avalanche de prêmios, assim como seu sucesso internacional?
Yoani Sánchez – Não tenho muito a dizer, a não ser expressar minha gratidão. Todo prêmio implica uma dose de subjetividade por parte do jurado. Todo prêmio é discutível. Por exemplo, muitos escritores latino-americanos mereciam o Prêmio Nobel de Literatura mais que Gabriel García Márquez.
SL – A senhora afirma isso porque acredita que ele não tem tanto talento ou por sua posição favorável à Revolução Cubana? A senhora não nega seu talento de escritor, ou nega?
YS – É minha opinião, mas não direi que ele obteve o prêmio por esse motivo nem vou acusá-lo de ser um agente do governo sueco.
SL – Ele obteve o prêmio por sua obra literária, enquanto a senhora foi recompensada por suas posições políticas contra o governo. É a impressão que temos.
YS – Falemos do prêmio Ortega y Gasset, do jornal El País, que suscita mais polêmica. Venci na categoria “Internet”. Alguns dizem que outros jornalistas não conseguiram, mas sou uma blogueira e sou pioneira neste campo. Considero-me uma personagem da internet. O júri do prêmio Ortega y Gasset é formado por personalidades extremamente prestigiadas e eu não diria que elas se prestaram a uma conspiração contra Cuba.
SL – A senhora não pode negar que o jornal espanhol El País tem uma linha editorial totalmente hostil a Cuba. E alguns acham que o prêmio, de 15.000 euros, foi uma forma de recompensar seus escritos contra o governo.
YS – As pessoas pensam o que querem. Acredito que meu trabalho foi recompensado. Meu blog tem 10 milhões de visitas por mês. É um furacão.
SL – Como a senhora faz para pagar os gastos com a administração de semelhante tráfego?
YS – Um amigo na Alemanha se encarregava disso, pois o site estava hospedado na Alemanha. Há mais de um ano está hospedado na Espanha, e consegui 18 meses gratuitos graças ao prêmio The Bob’s.
SL – E a tradução para 18 línguas?
YS – São amigos e admiradores que o fazem voluntária e gratuitamente.
SL – Muitas pessoas acham difícil acreditar nisso, pois nenhum outro site do mundo, nem mesmo os das mais importantes instituições internacionais, como as Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a OCDE, a União Europeia, dispõe de tantas versões de idioma. Nem o site do Departamento de Estado dos EUA, nem o da CIA contam com semelhante variedade.
YS – Digo-lhe a verdade.
SL – O presidente Obama inclusive respondeu a uma entrevista que a senhora fez. Como explica isso?
YS – Em primeiro lugar, quero dizer que não eram perguntas complacentes.
SL – Tampouco podemos afirmar que a senhora foi crítica, já que não pediu que ele suspendesse as sanções econômicas, sobre as quais a senhora diz que “são usadas como justificativa tanto para o descalabro produtivo quanto para reprimir os que pensam diferente”. É exatamente o que diz Washington sobre o tema.
O momento de maior atrevimento foi quando a senhora perguntou se ele pensava em invadir Cuba. Como a senhora explica que o presidente Obama tenha dedicado tempo a lhe responder apesar de sua agenda extremamente carregada, com uma crise econômica sem precedentes, a reforma do sistema de saúde, o Iraque, o Afeganistão, as bases militares na Colômbia, o golpe de Estado em Honduras e centenas de pedidos de entrevista dos mais importantes meios do mundo à espera?
YS – Tenho sorte. Quero lhe dizer que também enviei perguntas ao presidente Raúl Castro e ele não me respondeu. Não perco a esperança. Além disso, ele agora tem a vantagem de contar com as respostas de Obama.
SL – Como a senhora chegou até Obama?
YS – Transmiti as perguntas a várias pessoas que vinham me visitar e poderiam ter um contato com ele.
SL – Em sua opinião, Obama respondeu porque a senhora é uma blogueira cubana ou porque se opõe ao governo?
YS – Não creio. Obama respondeu porque fala com os cidadãos.
SL – Ele recebe milhões de solicitações a cada dia. Por que lhe respondeu, se a senhora é uma simples blogueira?
YS – Obama é próximo de minha geração, de meu modo de pensar.
SL – Mas por que a senhora? Existem milhões de blogueiros no mundo. Não acha que foi usada na guerra midiática de Washington contra Havana?
YS – Em minha opinião, ele talvez quisesse responder a alguns pontos, como a invasão de Cuba. Talvez eu tenha lhe dado a oportunidade de se manifestar sobre um tema que ele queria abordar havia muito tempo. A propaganda política nos fala constantemente de uma possível invasão de Cuba.
SL – Mas ocorreu uma, não?
YS – Quando?
SL – Em 1961. E, em 2003, Roger Noriega, subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos, disse que qualquer onda migratória cubana em direção aos Estados Unidos seria considerada uma ameaça à segurança nacional e exigiria uma resposta militar.
YS – É outro assunto. Voltando ao tema da entrevista, creio que ela permitiu esclarecer alguns pontos. Tenho a impressão de que há uma intenção de ambos os lados de não normalizar as relações, de não se entender. Perguntei-lhe quando encontraríamos uma solução.
SL – A seu ver, quem é responsável por este conflito entre os dois países?
YS – É difícil apontar um culpado.
SL – Neste caso específico, são os Estados Unidos que impõem sanções unilaterais a Cuba, e não o contrário.
YS – Sim, mas Cuba confiscou propriedades dos Estados Unidos.
SL – Tenho a impressão de que a senhora faz o papel de advogada de Washington.
YS – Os confiscos ocorreram.
SL – É verdade, mas foram realizados conforme o direito internacional. Cuba também confiscou propriedades da França, Espanha, Itália, Bélgica, Reino Unido, e indenizou estas nações. O único país que recusou as indenizações foram os Estados Unidos.
YS – Cuba também permitiu a instalação de bases militares em seu território e de mísseis de um império distante…
SL – …Como os Estados Unidos instalaram bases nucleares contra a URSS na Itália e na Turquia.
YS – Os mísseis nucleares podiam alcançar os Estados Unidos.
SL – Assim como os mísseis nucleares norte-americanos podiam alcançar Cuba ou a URSS.
YS – É verdade, mas creio que houve uma escalada no confronto por parte de ambos os países.

Comentários