LOUCOS (parte 3)



Por Adrián Paenza (foto), jornalista, matemático e professor argentino (reproduzido do jornal argentino Página/12, edição de 24/04/2013)

Os loucos. Os que pensam fora do convencional, os que são capazes de dizer “não”, os que se rebelam, os que não aceitam a ordem estabelecida. Ou os que olham mais longe.

A história tem múltiplos exemplos de pessoas que se atreveram a pensar de maneira diferente, e nenhuma lista será suficientemente exaustiva mesmo que não seja porque com certeza conhecemos muitos, mas quantos mais houve dos quais não temos nem ideia porque os submetemos com as “leis do sistema”?

Nesta segunda parte (o artigo foi dividido em duas partes no jornal argentino, aqui neste blog o foi em quatro partes) quero percorrer a história de outras pessoas que tiveram que lutar contra a mediocridade da época, discutidos, vilipendiados, atacados e até enlouquecidos e encarcerados. Aqui vão.

Gregor Mendel foi um frei de origem alemã, nascido no que hoje seria a República Tcheca. Filho de granjeiros, a fascinação pelo cultivo de algumas plantas e vegetais o levou a fazer múltiplos experimentos, especialmente com ervilhas. Alternando seu tempo entre a abadia e a granja, a história registra que entre 1856 e 1863 cultivou ao redor de 28 mil plantas. Começou fazendo diferentes cruzamentos entre elas (altas, baixas, sementes de diferentes formas e cores) e se ocupou especialmente de fazer um detalhado registro do que encontrava, quais as características que permaneciam no decorrer das gerações, quais as que desapareciam, quais as que se transformavam. Como Mendel tinha também uma educação matemática, se ocupou em estabelecer proporções do que acontecia também com outras plantas e com “ratones” (ratos?), buscando sinais “genéticos” que predominavam, outros que eram segregados e assim terminou descrevendo as que hoje se conhecem como as leis de Mendel. Para colocar em outros termos: foi Mendel quem descobriu as regras básicas sobre a transmissão por herança das características de pais a seus filhos. Os traços da mãe e do pai não se fundem, não se mesclam no filho/filha, e sim passam intactos. Algumas características são dominantes, outras não se manifestam, e a explicação de por que em uns casos sim e em outros casos não é meramente que umas são mais prováveis do que outras.

O trabalho de Mendel foi duramente criticado e ignorado. Ele mesmo escreveu em 1884, pouco tempo antes de morrer: “Estou convencido de que não passará muito tempo até que o mundo inteiro compreenda os resultados do meu trabalho”. Tiveram que passar mais de 40 anos após sua morte. Já na primeira parte do século 20, o trabalho de Mendel foi resgatado, reconhecido e valorizado. Mendel tem um lugar destacado na história da ciência, só reservado para os pioneiros em alguma especialidade, e suas leis, as conhecidas agora como as leis de Mendel, constituem o fundamento da genética.

John Logie Baird foi o inventor da televisão. Assim, tão categórico como soa. Foi o primeiro no mundo a mostrar um sistema de televisão em funcionamento. Dito de outra forma: foi o primeiro que pôde transmitir em forma “inalámbrica” (sem fio) imagens e som que foram recebidos por uma caixa especialmente projetada para tais efeitos. Nascido na Escócia em 1888, graduado como engenheiro, já na Inglaterra visitou os escritórios do jornal Daily Express para ajudar a difundir e promover seu invento. O editor-chefe disse o seguinte (de acordo com o que escreveu um dos jornalistas do diário, o que recebeu a instrução): “Pelo amor de Deus, vá à recepção e despacha um lunático que está lá. Diz que tem uma máquina que permite ver em forma “inalámbrica”. Tenha cuidado, pode ser que tenha uma navalha com ele”.

O som não era problema. A dificuldade eram as imagens. Depois de muitos anos de esforço, Baird logrou transmitir uma imagem muito fraca para uns poucos metros. Mas isso é o que era preciso. Embora tenha sido tratado como louco no começo, em 26 de janeiro de 1926 Baird fez uma demonstração de sua invenção frente a 50 cientistas reunidos no centro de Londres. O som e as imagens não viajavam de forma simultânea. Isso se pôde conseguir no ano de 1930. O “louco” da navalha tem hoje seu reconhecimento, apesar de outros –historicamente – levarem o crédito. (Continua – a parte 2 foi postada dia 29/abril)

Tradução: Jadson Oliveira

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