ARGENTINA: A DESINFORMAÇÃO – Por Carlos Girotti



(Foto: Página/12)
O jornalismo e os grandes meios de comunicação


Reflexões na comemoração do Dia do Jornalista, que se celebrou em 7 de junho. A falaz associação do poder dos grandes meios de comunicação com a liberdade de expressão. A substituição do lugar dos partidos políticos.


Por Carlos Girotti (*), no jornal Página/12, edição de 10/06/2014


Torna-se difícil imaginar hoje quem poderia ocupar, nas atuais circunstâncias, o lugar que ocuparam, a partir de 7 de junho de 1810 (Dia do Jornalista na Argentina, data em que foi fundada a Gazeta de Buenos Ayres, primeiro jornal da etapa independentista), revolucionários como Mariano Moreno, Juan José Castelli e Manuel Belgrano. O exemplo destes heróis de Maio (mês em que foi deflagrada a saga da independência, a chamada Revolução de Maio) –convertidos em redatores de La Gazeta – atravessou todas as épocas históricas e, com certeza, marcou o compromisso de insignes jornalistas argentinos. No entanto, nesta nova comemoração do Dia do Jornalista o permanente trabalho de desinformação a que se dedicam as grandes empresas jornalísticas obriga a uma reflexão de outro tipo.


É que o poder das grandes empresas da comunicação, diferentemente do que ocorria com o jornalismo revolucionário em 1810, veio dissimular a incapacidade política da classe dominante para dirigir o conjunto da sociedade e, na prática, os chamados multimeios começaram a atuar como verdadeiros substitutos de partidos de direita ou centro-direita. E mais: estas empresas, convertidas em remendo do “intelectual coletivo”, do que carece a classe dominante, vulgarizaram os princípios filosóficos hegemônicos, modelando deste modo, uma e outra vez, o senso comum da sociedade. Os temas que “preocupam a opinião pública” são, precisamente, aqueles que instalam os grandes meios de comunicação, lançando mão para isso de todos os suportes tecnológicos a seu alcance e, inclusive, apelando para toda espécie de programas televisivos, que vão desde o gênero de entretenimento até as novelas semanais e as séries unitárias.


Este trabalho constante de formação e modelação do senso comum mais amplo, esta recorrência aos valores sobre os quais se fundaram o terrorismo de Estado e a ofensiva neoliberal e, em suma, esta apelação a uma moral pretensamente imparcial e alheia às paixões sociais, não foram – para os setores dominantes – mais que a aplicação duma estratégia de recuperação das rédeas políticas do Estado desde que, em 2003, Néstor Kirchner iniciara o atual processo de expansão e aprofundamento de todos os direitos civis e de realinhamento com os povos irmãos e os governos democráticos da Pátria Grande. De fato, não foi uma mera casualidade que um homem do mundo jornalístico como José Claudio Escribano – então verdadeiro chefão do diário La Nación (o segundo jornal de direita mais influente na Argentina depois de Clarín) – tivesse querido condicionar Kirchner, logo que ele assumiu a presidência, com um memorando de recomendações que não dissimulavam o fundamento corporativo e autoritário que as animava.


De modo que comemorar o Dia do Jornalista, na Argentina atual, não pode ser concebível sem uma crítica frontal àqueles que, a partir do seu trabalho cotidiano, fazem tudo o que esteja ao seu alcance para destituir a experiência governamental que, além de ampliar os horizontes de igualdade na sociedade argentina, se empenhou em democratizar a palavra com a sanção e aplicação da Lei de Serviços da Comunicação Audiovisual (a famosa Ley de Medios argentina).


Assim, nenhuma matéria alusiva deveria finalizar sem reconhecer o compromisso, a paixão e a honestidade dos trabalhadores de imprensa, dos comunicadores populares e de todos aqueles meios impressos, radiofônicos e/ou televisivos que, diariamente, procuram seguir o caminho traçado por Jorge Ricardo Masetti, Emilio Jáuregui, Rodolfo Walsh, Paco Urondo, Haroldo Conti e José Luis Cabezas.

* Diretor de Comunicação da CTA (Central dos Trabalhadores da Argentina).


Tradução: Jadson Oliveira

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